Uma frase que explica mais de 500 anos

Nosso Lar

A foto é do Centro de Ensino Eurípedes Barsanulfo, que fica no subúrbio carioca do Lins de Vasconcelos.

Nesse prédio, entre 1983 e 1985, vivi alguns dos melhores anos da minha vida.

E foram tão bons porque foi aí que conheci alguns dos meus melhores amigos até hoje.

O colégio pertencia à extinta Caixa de Pecúlio dos Militares, a Capemi, sigla famosa nos anos 70 e início dos 80.

Na base da roubalheira, quebraram a Capemi. Só um exemplo ilustrativo para quem teima em acreditar que na ditadura não havia ladroagem.

Com destino incerto, o colégio foi assumido naquele tempo – com muita coragem e amor à educação – pela família que mantinha uma escola infantil, a Nosso Lar, a quem sou ligado por amizade e afeto até hoje.

No ano passado, a família decidiu – com todo direito – que não queria (e não podia) mais tocar o CEEB.

Até o momento, não apareceu ninguém disposto a investir no maior ativo (para usar bem a linguagem do mercado) que um país pode ter: a educação de seu povo.

Vivêssemos sob a égide de um estado que realmente pusesse em prática seu conceito original de cuidar da sociedade, o colégio seria encampado para servir a um ensino público de qualidade.

O prédio, um dos maiores da zona norte do Rio, se deteriora a olhos vistos, correndo o risco de a qualquer momento ser invadido por quem não tem (ou diz não ter) casa.

Eu não consigo dizer com palavras a dor que me causa, como ex-aluno, olhar essa foto. Qualquer coisa que eu possa escrever estará muito longe da alegria que eu sentia em ir todas as manhãs para este lugar.

Mas a pichação na fachada explica exatamente porque a Suécia tem, continuadamente, os melhores índices de desenvolvimento humano, e porque o Brasil patina há mais de 500 anos em seus vários níveis de indigência.

Lula X Moro: dúvidas e angústia de um brasileiro comum

angustiado

Confesso que desde que o Lula foi condenado pelo Moro, caí numa espécie de letargia, e minha opinião sobre o assunto não vai além de uma massa amorfa, sem cor, sem gosto, sem temperatura.

Logo eu, que até por força de ofício sempre me empenhei em arranjar o que dizer.

Hoje, o máximo que alcanço é: não sei.
Não consigo enxergar provas, ao menos as ditas cabais, contra o ex-presidente, por mais que a TV Globo gaste metade do Fantástico tentando garantir que elas existem.

Mas o que me incomoda – e sempre me incomodou nesse imbróglio de petrolão, tríplex e que tais – é o tanto de acusação contra Lula.

Não tenho dúvida de que o PT se perdeu inteiramente no jogo do poder, inclusive pelo caminho da roubalheira. Mas aguardo que me provem se Lula também cedeu ou não ao canto do cisne.

Cá na minha pureza de honrador de IPVA e IPTU em quantas prestações o estado me permita livrar-me da faca afiada que ele põe sobre minha jugular todos os anos, ainda sou o tipo que pensa que pelo o que Lula se propôs a fazer pelo país, nas inúmeras campanhas eleitorais, não deveria existir sequer uma pulga atrás da orelha de algum de nós em relação à sua integridade.

Mas existe. Um circo de pulgas, aliás. E atrás das orelhas de milhões que, como eu, não estão convencidos nem do sim nem do não.

Assim como não me convence – e nunca convenceu – a figura ungida de santidade midiática do juiz de Curitiba.

Igualmente me incomoda demais a imagem dele cochichando aos risos com Aécio Neves poucos meses atrás (e essa foto é só um exemplo de procedimentos duvidosos).

Será que ali, ele, um juiz, não tinha sequer uma desconfiança de que o senador estava enrolado também nesse dominó todo?

Acho que isso deveria incomodar também os que enxergam em Moro uma espécie de Capitão América com alma feminina de mulher maravilha.

Do eleitor convicto que fui em outras eras, restou somente que a expectativa para 2018 é a de que eu seja um cidadão cabisbaixo, com a certeza apenas de ‘em quem não votar’, o que é muito pouco para os meus padrões de politização.

Enquanto isso, Bolsonaro sobe nas pesquisas.

E aí, o que me assalta não é somente a dúvida, mas também a angústia e o desespero.

Cabelo em ovo, chifre em cavalo (ou sobre os leitores sensíveis)

Passei uns três dias pensando e cheguei à conclusão que, no fundo, eu já esperava chegar: o tal do leitor sensível é realmente censura.

Ou melhor, é patrulhamento ideológico, que é a censura sem o poder de veto do estado.

Patrulhamento ideológico, pelo que reza a história política do país, é uma expressão que surgiu nos anos sessenta. Era praticado por setores da esquerda que realmente têm dificuldade em conviver com a democracia, com a opinião diversa e, especialmente, contrária.

Embora seja e já tenha me posicionado contra atrocidades do tipo homofobia e racismo, confesso o temor de estar na mira do leitor sensível, aquele que será pago pelas editoras (e o fará também nos canais de produção de conteúdo, como as redes sociais) para identificar preconceitos raciais, de gênero, de orientação sexual – e por aí vai – nos livros.

Para Sempre Cinderela
Para Sempre Cinderela

Sou homem de classe média (bem média mesmo, quase fodida, embora melhor que a maioria no país), branco, olhos claros, meia idade, descendente de europeu. Sou o protótipo físico do racista, do homofóbico, do machista, e numa sociedade em que a aparência instiga julgamentos instantâneos, já me sinto vigiado com atenção redobrada pelo leitor sensível.

É claro que não vou me intimidar, mas temo que ao criar, por exemplo, um personagem que odeia negros ou homossexuais, a patrulha dos que muitas vezes enxergam chifre em cavalo e cabelo em ovo venha para cima de mim dizer que aquilo na verdade é meu preconceito expresso numa terceira voz disfarçada. É algo que os próprios críticos literários dizem da Emília em relação a Monteiro Lobato.

A figura do leitor sensível não ajuda em nada no combate a preconceitos. Ao contrário, pelo que vejo está é instigando a salivação dos Danilos Gentiles e Bolsonaros de plantão, que pisoteiam com escárnio o (necessário) politicamente correto, a na verdade dizerem prazerosamente: olha lá, tá vendo como é ditadora essa cambada de preto, bicha, sapatão e feminista?

Liberdade de expressão é tão importante em uma sociedade que a luta contra o preconceito passa necessariamente – e até obviamente – por ela.

Nos casos de apologia, via literatura, do racismo e seus odiosos similares discriminatórios, mais eficaz e salutar que a figura do leitor sensível será o boicote à obra, e, em última análise, a Justiça.

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