Vontade que dá

sickchirpse.com
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Uma diarista me conta que está trabalhando três vezes na semana em uma casa cinematográfica no Lago Norte, bairro chique de Brasília.

Segundo ela, a mansão é toda high-tech, “tem até parede que sai do lugar para aumentar espaço, acredita?”, ela fala, e eu tento imaginar como é uma parede que saia do lugar.

A dona da casa, segundo ela, tem uns trezentos pares de sapatos, e apenas para guardar joias, uma parte considerável de um armário em um dos tantos quartos (ela até hoje não tem certeza de quantos são).

Mas a patroa, que talvez não consiga usar tantos sapatos ao longo da vida, já no primeiro dia de trabalho de minha colega diarista mandou que ela levasse de casa o próprio almoço.

Claro, a gente pode compreender e imaginar que num lugar tão carente, de tanta pobreza, um prato de comida deva realmente fazer muita falta.

Aliás, o dia em que soube dessa história, precisamente ontem, foi realmente difícil.

A avenida L2 Norte é uma das tantas retas de Brasília.

No final dela, havia um imenso terreno aberto e gramado (eu costumava dar uns pedais por ali, simulando trilha).

Há poucos meses, começou uma obra faraônica no local, daquelas em que há até guindaste gigantesco para levantar coisa muito pesada.

Finalmente consegui saber o que vão fazer ali (não há uma placa anunciando o que vai ser).

Perguntei a uma dupla de operários, que estava descansando em frente, na hora do almoço.

“Vai ser igreja”, contou um deles.

“Que igreja? Universal? Assembleia de Deus?”, eu quis saber.

“Dos ‘mórmus´”, me respondeu.

Nada contra igrejas, ou religiões, especialmente se elas tornam o sujeito uma pessoa melhor (algo que muita delas, a julgar pelo que vemos, não parecem fazer), mas em um país que precisa tanto de escola, de hospital, de área pública de lazer, de moradia popular (aliás, bem ao lado da obra há duas invasões miseráveis de catadores de lixo) vão levantar mais uma igreja?

Às vezes – principalmente de uns anos para cá – tenho realmente muita vontade de mandar o Brasil ir se foder.

Começando por Brasília.

Another brick in the wall

The Wall

Não tive um professor que tenha me marcado profundamente.

Na verdade, hoje os acho agentes (até inconscientes) de um sistema opressor, que te forma para trabalhar e produzir riqueza para que meia dúzia de três ou quatro se locupletem e deixem herança para seus descendentes.

E, claro, para que você não incomode o poder vigente.

Um sistema que privilegia a área de exatas, em detrimento do pensamento crítico e do autoconhecimento.

Tanto é assim que sempre são considerados melhores alunos aqueles que se destacam nas matérias que exigem cálculo.

Pro bem e pro mal, no meu caso, o papel de mestre acabou ficando com a vida mesmo.

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