Nasci em maio de 68. Com orgulho.
Sou um cara de poucas vaidades, mas as que tenho me são caras.
Uma delas é ter nascido em maio de 68.
Os que viveram a época contam e a história confirma: o mundo nunca mais foi o mesmo depois dos anos 60 do século 20. E aqueles anos 60 ficaram diferentes também depois de maio de 68, a partir da quebradeira na França que buscava avançar na educação, na sexualidade e no prazer ( http://pt.wikipedia.org/wiki/Maio_de_1968 ) . A França! sempre a França pra sacudir o mundo.
No Brasil, o pau começava a quebrar também, e a noite escurecia para o lado de quem insistia nessa história de democracia, liberdade de expressão e afins. O pau-de-arara salivava, aguardando a hora de entrar para as trevas da história.
Quando nasci, os Beatles estavam lançando o Albúm Branco, a mais completa obra da mais completa banda da história, responsável por boa parte da lenha da fogueira da época. Havia também os Stones gravando Jumping Jack Flash ( http://letras.terra.com.br/the-rolling-stones/68368/ ) , um dos poucos momentos em que uma banda de Rock atingiu a perfeição. Logo no primeiro verso, eles avisam: eu nasci em um furacão atravessando o fogo.
Desse lado do Atlântico, a Tropicália fazia com que o Brasil, bem ou mal, embarcasse também na doideira, para que a memória do país guardasse ao menos alguma coisa boa daqueles tempos.
Nascido em 68, tive medo do mundo se acabar em mísseis atômicos durante a guerra fria, esse pavor que EUA, Israel e ONU tentam fazer com que sintamos outra vez, demonizando o Irã.
Vi comunista desiludido perguntando o que fazer da vida quando o muro de Berlim caiu em 89.
Com brasileiro fazendo Rock de qualidade, votei na primeira eleição para presidente depois de quase 30 anos. Como repórter contei como puseram o eleito no olho da rua. Aliás, nesse posto, assisti, a menos de 50 metros, a um metalúrgico receber a faixa de Presidente da República. Mais tarde, como cidadão, também me decepcionei.
Hoje, metade da mesma França, e a Europa como um todo, quer banir do país os imigrantes cuja pele não tenha a brancura azeda da tez europeia, algo completamente incompatível com qualquer histórico de luta por liberdade, igualdade ou outra palavra que rime e esteja no mesmo campo semântico.
Já o Brasil, mais endinheirado e desmatado que o de 68, está em conflito existencial para aceitar que homens podem se casar com homens, mulheres com mulheres e que de uma vez por todas é preciso dar um jeito na situação dos negros.
Tudo isso, sem Tropicália, sem Rock’n Roll, mas esticando ao máximo o sucesso de Michel Teló, até que outro salte da lixeira cultural para os holofotes.
No futuro, alguém terá orgulho de ter nascido em maio de 2012?