As meninas aprontavam-se para um banho de piscina. Posto o biquíni, a mais velha chegou para o pai, apontando a barriga desnuda. Ali, naquele ponto que indicava, segundo ela, três anos antes a irmã cravara-lhe uma dentada, certamente em alguma disputa por brinquedo ou doce.
Absorvido pelas coisas desimportantes das “gentes grandes”, pouca atenção deu o pai ao queixume, até porque nos breves segundos em que seguiu a indicação do pequeno dedo, nenhuma marca de dentes ou outra qualquer enxergou na barriga desinibida da pequena criatura.
Inventada ou não, a lembrança da garota chamou a atenção da irmã. Na leveza dócil dos seis anos, a suposta e cândida canibal aproximou-se. Ajeitando os óculos, queria ver a marca de seus dentes na carne gerada no mesmo ventre de onde viera. Mas a outra, como se tomada por mágoa arrastada durante um triênio, resolveu espezinhar, e toca de virar de costas, escondendo a pançinha.
E assim ficaram por uns barulhentos instantes: uma girando em torno de si mesma, escondendo a marca que jurava carregar, e a outra acompanhando-a nas voltas, tentando ver o que as mãos da irmã a impediam.
Mas girar girar girar cansa e dá tonteira. Foi quando resolveu tentar pelo argumento, embora irritada, sem tom de negociação: Fui eu quem mordi, eu tenho direito de ver! E as lentes aumentavam seus olhos azuis arregalados, que eram, naquela idade, espelho de suas primeiras convicções.
Que bom que vc voltou a escrever, e esse conto abre maravilhosamente essa nova fase! É bom estar contigo aqui todos os dias! Linda história, imaginei tudo! A menina que mordeu tem razão!
Consegui ver a cena. Argumentos de criança costumam mesmo ser criativos. Que bom que está de volta.
Adorei a história de criança. E também o seu retorno.
Que lindo! Merece ganhar ilustração e virar livrinho infantil. Ser escritor e isso, transformar uma briguinha de irmãs em literatura de ótima qualidade.