O Catetinho e o Brasil simples.

Do lado direito da rodovia que liga o Rio de Janeiro a Brasília (BR 040), bem junto à entrada da cidade do Gama, fica um dos principais marcos da época da construção da nova capital.

O Catetinho está escondido atrás de uma curva, cerca de 200 metros após a saída da estrada. Os mais apressados ou desatentos à sinalização talvez nem notem a indicação de que ali fica um palácio, mesmo que de todo modo a construção renegue o substantivo que ostenta tanto garbo.

JK dormia ali quando vinha visitar o imenso canteiro de obras que virou o Planalto Central. Era, pois, a residência do Presidente da República naquele imenso rasgo vermelho que homens e máquinas abriram no cerrado. Por isso há quem o chame de palácio, especialmente os adoradores dos “oficialismos” da história. O Catetinho foi batizado assim por causa do – este sim pomposo – palácio da Rua do Catete, ícone do Rio capital da república, volte e meia trocado por Buenos Aires na desinformação do primeiro mundo. Catetinho, no diminutivo, soa como paródia, coisa bem de brasileiro.

O diminutivo do nome não resume apenas o tamanho da construção. Retrata também sua simpatia, calcada certamente na simplicidade.

Erguido em apenas dez dias, o Catetinho, claro, nasceu do traço de Oscar Niemayer, que deu forma à idéia de um grupo de amigos de Juscelino. O grupo se quotizou e bancou a casa em que o presidente morou enquanto construía Brasília.

Pela urgência em ficar pronto e pelos recursos disponíveis, o Catetinho foi feito em madeira. São apenas dois andares. Em cima, a sala de trabalho de JK e três ou quatro quartos, entre eles o do próprio presidente. Juscelino dormia em uma cama de casal tamanho padrão, posta em um espaço não maior que vinte metros quadrados, o necessário para uma mobília totalmente despojada de requinte. Colado ao quarto, um banheiro com uma pequena banheira. Juntos, quarto e banheiro certamente desapareceriam na imensidão suntuosa dos cômodos das mansões de hoje em dia da capital do país.

Embaixo estão a cozinha, a lavanderia e pequenas salas que eram depósitos na época, além de um espaço aberto que servia de refeitório. Nele, e em longas mesas de madeira, conta a história do Catetinho que JK almoçava ao lado dos engenheiros e dos operários, juntando o poder, a elite trabalhadora graduada na univerisdade e a parte de baixo que sustentava – e levantava – a pirâmide do sonho de Brasília, um convívio impossível na cidade dos dias de hoje com sua segregação social.

A ligar todos os cantos do Catetinho, ou o chão de cimento no lado de fora ou aquela cerâmica vermelha, tosca, tolida de qualquer acabamento.

É ingenuidade pensar que a época da construção de Brasília foi um tempo de anjos, de homens santos investidos de nobre missão. Corre paralela à versão oficial, a história – entre tantas outras – dos caminhões de terra que faziam uma viagem e recebiam por quatro. Mas passando os olhos pelo Catetinho e logo em seguida pelo Brasil de hoje, e principalmente pela Brasília de hoje, é de se duvidar de que os homens públicos de agora se contentariam com uma simples casa de madeira.

6 comentários em “O Catetinho e o Brasil simples.”

  1. josé de lima da paz

    Belo gesto esse seu, caro André, de descrever o Catetinho, pois servirá à posteridade se um dia algum inescrupulosos, ou até mesmo um acidente o façam desaparecer. Deve haver outras descrições, todavia a sua é mais uma para colaborar com a história. A homens como vc, deve-se muitas informações que temos hj. Parabéns!

  2. Herivelto Gabriel

    Quando ouvi você na BandNews falando sobre essa visita ao Catetinho eu fiquei pensando “Nasci em Brasília e nunca fui lá ?” juro que fiquei com vergonha, pois como um apaixonado por Brasília eu gostou muito da história do JK. Minha filha já foi em passeio escolar e tirou lindas fotos do Catetinho, minhas esposa (Professora) já falou que eu preciso conhecer o Catetinho. Está decidido ! como estarei de férias semana que vem (18/01) vou adicioná-lo no meu guia de férias. Abraço.

  3. Raquel Madeira

    Certamente nossos políticos de hoje iriam querer uma mansão com 6 suítes. Você só esqueceu de mencionar a mata que certa o Catetinho e que também vale muito a pena visitar e passar alguns momentos sentindo o cheiro da mata tão diferente do cerrado. como sempre, belo texto

  4. Interessante essa história. Gostaria de visitar esse lugar na minha próxima visita à Brasília. Belo texto, André sua narração é excelente e nos traz um conhecimento sobre fato que para mim era totalmente desconhecido. Obrigada por dividir com seus leitores esses conhecimentos.

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