Périplos no país da musiquinha

Neste fim de ano, tive problemas com o carro na estrada.

À noite. Chovendo. Com três crianças pequenas.

A experiência não é ruim apenas pela situação em si, mas também porque nos leva a precisar das seguradoras, as mesmas que, a exemplo de bancos e telefônicas, exibem o paraíso na propaganda e nos entregam o inferno na prestação do serviço.

Até não tenho muito que reclamar do socorro mecânico. O guincho veio relativamente rápido, ainda mais se levando em consideração a hora e a localidade. Mas a promessa foi de que junto viria um táxi para que eu pudesse seguir viagem com – repito – três crianças pequenas, vulnerabilidade deixada bem clara por mim várias vezes às atendentes do BB Seguro Auto.

Foram mais de dez ligações para saber se o táxi prometido naquela quase véspera de natal viria ao menos antes do carnaval. Em uma delas, fiquei 12 minutos na linha escutando uma daquelas musiquinhas que acabam com os nervos. Por duas vezes, após minutos de espera – e musiquinha, é claro – a ligação caiu, me obrigando a ouvir novamente a voz pretensamente simpática e amistosa da gravação sobre o menu de serviços.

Por sorte minha, havia caridade no socorrista, que, esperando a situação se resolver, ficou comigo no local, um posto de gasolina fechado na escuridão da BR 040, em Minas. Experiente no serviço, sugeriu: “Eles não têm táxi hoje para mandar e não querem dizer pro senhor. Eu lhe deixo num hotel aqui perto e o senhor marca um táxi para amanhã”.

Assim fiz, e só assim consegui ter um fim de noite – início de madrugada – razoavelmente bom, ainda mais depois da adversidade.  É claro que, no hotel, antes de conseguir o táxi pro dia seguinte, ainda ouvi uns 40 minutos de musiquinha em umas três ou quatro ligações.

 

telefone

O mesmo desfecho, no entanto, não alcancei ao tentar levar o carro para consertar em uma concessionária (a Roma, da Fiat, na Tijuca, Rio), já no dia seguinte. Mais de meia hora de tele espera, música enervante e ligação interrompida para, ao final, acabar levando o carro no mecânico da esquina, que, aliás, resolveu o problema em pouco menos de uma hora.

Não cheguei a procurar qualquer pesquisa ou dado que embase a conclusão a que cheguei. Mas pela experiência vivida na carne, o que se percebe é que realmente o poder aquisitivo das pessoas aumentou nos últimos dez anos, a julgar, inclusive, pela quantidade de carros na estrada.

É ótimo, e principalmente justo, que mais pessoas estejam ganhando mais, com mais acesso ao conforto. Mas o mesmo país que ainda padece com a falta de infraestrutura é o mesmo que não percebeu, e, por isso, como de costume, não planejou a necessidade de se melhorar a prestação de serviços.

Essas pessoas, e era de se esperar, iriam naturalmente precisar de seguros para automóveis, de assistência técnica, iriam precisar de estradas melhores e mais seguras (embora no caso da recém privatizada 040, ela esteja, pelo menos em relação ao asfalto, bem melhor do que estava no começo dos anos dois mil).

Mas o que se percebe, quando se chega a praticamente implorar por certo tipo de serviço, não é apenas falta de estrutura de diversos setores, mas também falta de preparo profissional, reflexo natural da deficiência de nosso ensino, inclusive na educação de base.

Enquanto isso não se resolve, haja nervos pra aguentar tanta musiquinha na orelha quente por causa do telefone.

2 comentários em “Périplos no país da musiquinha”

  1. Elaine Curty

    Concordo com vc, André!A prestação de serviços em nosso país é de baixa qualidade em quase todos os setores.Passei por uma situação como a sua, envolvendo um problema mecânico no meu carro. Acionei a seguradora . Como o veículo voltou a funcionar quando o funcionário da Bradesco Seguros chegou, ele se recusou a ver o que havia ocorrido, mesmo com a minha informação de que o carro iria pifar a qualquer instante. Ele, então, me sugeriu que pagasse o serviço à parte, sabe…Um suborninho que rejeitei. Comuniquei o fato a seguradora que parece não ter se importado.Coisas da vida. Coisas do Brasil. Um abraço.

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