Zico, Zicão, Zicaço!

Eu era estagiário na Rádio Manchete AM do Rio quando, lá pelo final dos anos 80, me mandaram cobrir o lançamento de uma campanha do governo contra a AIDS. O filme era estrelado por vários artistas e atletas, gente do top de Ayrton Senna e Xuxa, o casalzinho da época. Entrevistar um dos figurões era trabalho elementar para qualquer repórter que ali estivesse.

A mim, entretanto, apenas um importava: Zico!

Cheguei trêmulo perto dele e perguntei se poderia entrevistá-lo. Nervoso, me enrolei para ligar o gravador. Gaguejei e perguntei qualquer bobagem sobre a importância da campanha. Não prestei atenção a uma vírgula do que ele disse. Enquanto Zico falava, olhava seu rosto e à minha memória vinham apenas as tardes de domingo, os braços pro alto e o grito pela felicidade de um gol do Flamengo naquele templo mágico que era o antigo Maracanã.

Alguns anos mais tarde, jornalista um pouco mais experiente, fui entrevistá-lo para um especial da Rádio CBN sobre o centenário do Flamengo. Esperei quase nada que ele me atendesse. Quando foi a hora, o próprio Zico saiu da sala e mandou que eu entrasse. Ficamos mais de uma hora conversando. Ele, à vontade, como se nem fosse um dos maiores jogadores da história conversando com um jornalista desconhecido.

Quando terminou a entrevista, e antes de me despedir, disse o que queria ter dito anos antes, no lançamento da campanha, mas que não tive coragem.

-Cara, eu sou Flamengo por causa de duas pessoas…

Me olhou sorrindo, calado, esperando a conclusão.

-Meu pai…

E ele franziu a testa, mantendo o sorriso.

-…e você.

Ficou vermelho, encabulado.

-Valeu, garoto! Vai nessa!- e me estendeu a mão.

Definitivamente, aquele era o meu ídolo.

5 comentários em “Zico, Zicão, Zicaço!”

  1. Sou Flamengo por causa de um primo e por causa do Zico.
    Até hoje me emociono quando vejo as cenas de despedida do Galinho… O maior sonho de minha vida, como torcedor, é um dia conhecer pessoalmente o Zico.

  2. Carlos Henrique

    André, me tornei Flamengo também pelo Zico e hoje, digo com certeza, que sou muito mais Zico do que Flamengo. Quando assisto a alguma exibição desastrosa da equipe atual, pego algum vídeo da minha coleção antiga e fico com os olhos marejados com as atuações do Galinho… E nem preciso dizer que meu filho se chama Arthur! Por que será? À propósito, consegui seu livro “Voando pela noite (até de manhã)” em um sebo de Copacabana e é o único livro seu que ainda não li. Grande abraço!

  3. André, adorei seu relato. foi exatamente assim que me senti em minha defesa de mestrado. enquanto ana falava, voltei no tempo… revisitei na memória as aulas da ana laura, sala de aula cheia, 6a. à noite, último tempo… e os alunos ali, embevecidos, ouvindo a professora ana…. um dia ela ainda saberá disso. temos zico, ana, paulo…. eles existem e são inesquecíveis.

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