A solidão do livro emprestado

Mário virou o copo, bebeu tudo praticamente em um único gole e com um movimento leve matou aquele restinho que fica no fundo, abaixo dos cubos de gelo. Foi para o quar­to e trancou a porta. Marion intrigada escutava da sala o barulho do guarda-roupa sendo remexido. Ouviu a janela ser aberta com rispidez e Mário gritando logo em seguida, olha só o que eu estou fazendo com a porra dos teus cigarros. A janela do quarto era colada na da sala, de forma que pôde assistir ao marido destemperado abrir dois pacotes de Minister que ela comprara para estocar no fim de semana. Mário abria cada maço, quebrava um por um dos cigarros e os jogava pela janela, gritando toma, sua tabagista inveterada, olha aqui ó, sua boca de cinzeiro, espia só o que eu tô fazendo, sua acio­nista da Souza Cruz, vai morrer em paz de câncer no pulmão, vai! Possessa, Marion não teve dúvida, ah é? É isso que você quer então, não é? Amassou o cigarro aceso no cinzeiro e tratou de trancar também a porta de um pequeno hall que liga­va a sala ao quarto. Foi até o bar, pegou uma por uma das garrafas de uísque, abriu todas e colocou-as lado a lado no parapeito da janela. Começou também a gritar, olha aqui ó, seu cachaceiro, e berrava para o marido, mostrando uma gar­rafa de ponta cabeça, todo o conteúdo sendo defenestrado. Olha só o seu Chivas Reagal onde vai parar, agora o Ballantine’s 12 anos, e a edição especial do JB 25 anos, espia só, e despe­java todos até a última gota.

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