Da internet para os livros.

A escritora Ana Cristina Melo está lançando a novela infanto-juvenil Caixa de Desejos. É o livro de estréia da autora que, no entanto, já tem muita ligação e intimidade com a literatura. E também com a blogosfera e as mídias sociais. É através desses canais que Ana Cristina Melo divulga de maneira intensa o que se escreve e o que se lança no Brasil. Ela arruma tempo para escrever e mantersimplesmente cinco sites e blogs: http://canastradecontos.blogspot.comhttp://ficcaodegaveta.blogspot.comhttp://www.anacristinamelo.com.brhttp://caixadedesejos.wordpress.com., e o mais famosos deles, http://www.sobrecapa.com.br

Abaixo um pequeno resumo de Caixa de Desejos nas palavras da própria autora. Em seguida, confira uma entrevista que o blog fez com essa analista de sistemas de profissão, e escritora por talento e paixão pelas letras.

“Caixa de Desejos é uma novela juvenil. Conta a história da Marília, uma menina que vive com os pais, os avós maternos e o tio paterno, mas tem uma ligação muito forte com a avó materna que mora em outra cidade. Logo no início da história essa avó morre e ela ainda tem que lidar com a chegada de uma meia-irmã que só viu duas vezes na vida. Para ajudá-la nesse processo de perda, Marília conta com uma caixa que a avó lhe deu de presente, antes de morrer. Uma caixa mágica para ela guardar seus desejos. Assim, ela vai se descobrindo, descobrindo a relação com a irmã, aprendendo a conviver na escola e entendendo como lidar com um primeiro amor que surge em sua vida.”

P – Por que estrear na literatura com um livro infanto-juvenil?

Ana – Enviei para poucas editoras quatro originais que estavam prontos: um livro de contos, dois infantis e um juvenil. A primeira resposta positiva que recebi foi do juvenil. Caixa de Desejos tem uma história curiosa. Eu havia colocado um ponto final no livro de contos, no qual vinha trabalhando há quatro anos, incluindo alguns textos, retirando outros, retrabalhando sempre. Dei por encerrado, pois não aguentava mais. Havia uma saturação em ler sempre a mesma coisa. Cheguei a enjoar de alguns contos dos quais antes gostava muito. Precisava escrever algo diferente que me “limpasse”. Comecei a desenvolver um projeto de romance, mas em paralelo me surgiu a história de Caixa de Desejos, que veio de rajada. Foi amor à primeira escrita (rs). Quando meu editor disse que havia adorado e queria publicá-la, fiquei muito feliz. Afinal, estou estreando com um texto pelo qual sou completamente apaixonada.

P – Pelo resumo que você fez, a história tem a família como eixo central. Será que em nossas casas temos mesmo muita riqueza de material para trabalharmos?

Ana – Para mim, não só dentro de casa, mas na vizinhança, nos relacionamentos dos vários tipos que nos cercam. Esse tema relacionamento/família é muito forte para mim. A maior parte dos meus textos trata de relações humanas. E mesmo que esses textos busquem outros cenários, não dá para fugir de uma verdade: a relação mais delicada está dentro de casa, com a nossa família. Acredito que só é possível dizermos que somos felizes, no dia em que entendermos as relações que temos com o mundo.

P – Pelo que sei, sua formação profissional é bem distante das letras. O que te fez se aproximar da literatura?

Ana – O amor pela literatura é anterior à minha formação em Análise de Sistemas. Eu tinha nove anos quando me encantei pelos livros. E essa fagulha me foi apresentada em sala de aula. Primeiro com alguns textos que apareciam nos livros didáticos. Houve um poema que me mostrou na prática o que é a força das palavras. Há pouco tempo, me lembrei dele, ou parte dele, e fiquei agoniada por não tê-lo completo. Tentei a internet, mas não havia nenhum vestígio. Então, coloquei um post em meu blog (Canastra), do tipo “procura-se”. E para minha felicidade, um leitor o trouxe na íntegra. Chama-se “A boneca” e está reproduzido no meu site (www.anacristinamelo.com.br). Mas existiram outras fagulhas: encenávamos peças na escola (fui a “bruxinha que era boa” e a narradora do “pintinho que nasceu quadrado”); depois, fomos apresentados à coleção Vaga-lume. Daí começou meu amor. Escrevia poemas que geravam páginas e páginas datilografadas; se perderam, ainda bem (rs). Quando fui cursar o segundo grau, tive que optar por seguir uma carreira, pois vinha de família de poucas posses. Um dia assistindo tevê, vi uma reportagem sobre computadores (que naquela época era algo muito distante da nossa realidade) e gostei da ideia. Resultado: 23 anos como Analista e professora, mais três livros técnicos publicados, saindo o quarto mês que vem. Mas há cinco anos, descobri que não estava realizada, que faltava algo em minha vida. Primeiro, para conseguir me entender, retomei com fúria a leitura que vinha sendo deixada em último plano, em razão da necessidade das leituras técnicas. Foi o suficiente para eu perceber o que estava faltando: o desejo de menina de me tornar escritora. Nessas décadas, foram tantas palavras que me preencheram, que transbordou.

P – E o site? Por que teve a idéia de criar um para divulgar literatura?

Ana – Outro dia, li algo sobre o meu signo que cai perfeitamente na minha personalidade: o ariano vive tudo intensamente. Não acredito em previsões de horóscopo, mas as características que são atribuídas ao meu signo se encaixam com perfeição no que sou. Essa intensidade foi convivendo com a necessidade de cada vez mais respirar a literatura. Daí nasceu o blog Canastra de Contos, para ser um cantinho em que eu pudesse falar, ouvir, trocar ideias sobre a escrita e a leitura. Desde que comecei a escrever, participava de alguns concursos literários, mas às vezes perdia alguns por esquecer do prazo e ter que visitar mais de um site para encontrar os editais. Foi assim que nasceu o Ficção de Gaveta, um blog de concursos criado para ser a minha agenda. Quando me dei conta, ele era de utilidade pública e não podia mais parar. O Sobrecapa surgiu a partir do Canastra. Eu costumava pegar os lançamentos da semana e pesquisava editora, gênero literário e algo a mais sobre os autores, para divulgar no blog. Fui percebendo que as notinhas que saíam nos jornais eram insuficientes. Então, pensei: por que não criar um cantinho dedicado a isso? Como sempre me incomodou o espaço que a mídia dá aos livros estrangeiros, em detrimento dos nossos, resolvi que o site só trabalharia com autores nacionais. Seguindo essa linha, venho tentando a publicação de uma lista de mais vendidos, exclusiva da literatura brasileira, o que tenho conseguido com muito suor.

P – A internet tem conseguido divulgar a literatura, principalmente a nossa, sempre sem espaço nos grandes veículos?

Ana – Acho que sim. Se não fosse a Internet, muitos autores continuariam desconhecidos. As crianças conhecem mais dos nossos escritores do que os adultos, pois elas leem sem preconceitos. Os adultos acabam seguindo a moda que está nas revistas, nos jornais, no colega ao lado que seguiu o mesmo caminho. Mas a Internet, hoje, também abre muito o leque. Precisaríamos concentrar essas informações em alguns lugares, como por exemplo, os cadernos literários. Mas, infelizmente, os poucos que temos precisam olhar com mais carinho para a literatura brasileira.

P – O que você gosta de ler?

 

Ana – Romances, contos, infantojuvenil e poesia. Infelizmente, a literatura ocupa os espaços livres, pois a maior parte do meu tempo trabalho na minha profissão, de onde vem o sustento. Isso me obriga a dividir as brechas entre a família, a escrita, a divulgação e a leitura. Por isso, adoro fila de qualquer coisa, é um ótimo lugar para ler (rs). Também leio com frequência livros de teoria literária. O que lamento é não conseguir encaixar tempo para ler algumas biografias. Essas estão sempre no final da fila, posição quase inalcançável. Minha estante está transbordando livros. Agora adotei a fila do “a ler” e do “a comprar”.

P – Que autores te influenciaram ou influenciam?

Ana – Não tive um autor preferido na infância, até porque aos quinze anos eu já estava trabalhando com Informática, e buscando me aperfeiçoar nessa área. Mas quando tornei novamente a literatura como prioridade, me apaixonei por alguns autores. Os principais foram Machado de Assis, Fernando Sabino, Clarice Lispector, Gustave Flaubert e Jorge Luís Borges. Na literatura infantojuvenil, Monteiro Lobato e Lygia Bojunga.

P – Na sua opinião, como deve ser a aproximação da criança dos livros? Como despertá-las para a leitura?

Ana – Nunca por obrigação, nem muito menos como receita de bolo para se discutir textos literários de cânones. Os clássicos existem e precisam ser apresentados aos jovens, mas antes é preciso que eles se apaixonem pelas palavras e, consequentemente, pelos livros. Isso só se dá se eles forem fisgados pela história. E, nessa linha, acho que há várias formas, que devem ser adequadas a cada tipo de classe, levando em consideração outros fatores. Encenar um texto é um ótimo caminho, assim como debater enredos em sala, aproximando o texto literário da realidade do aluno. Mas se tem algo que acho péssimo é o tradicional “leia para fazer prova”. Literatura não é obrigação, é arte. Arte não é uníssona no gosto. Por isso, é preciso respeitar o limite de cada aluno, mais do que isso, é preciso deixar as crianças e jovens flertarem com os livros. Compromisso sério, só mais tarde.

P – Voltando ao livro. Ele parece que fala de uma perda na vida da personagem principal. As perdas tornam as pessoas mais fortes e, consequentemente, as fazem personagens mais interessantes literariamente?

Ana – Não diria que são as perdas que tornam as pessoas mais fortes, mas como lidamos com elas. Isso acontece na vida de qualquer um e em situações diferentes. Imagine um pai de família que fica desempregado. Isso é uma grande perda. Ele pode tomar duas atitudes: uma é literalmente sentar e reclamar da vida, praguejando sua sorte; a outra é erguer a cabeça e ir à luta. No segundo caminho, é mais fácil descobrir a janela aberta, enquanto que se ficarmos apenas no primeiro, certamente só veremos a porta fechada. Acho que o que torna um personagem interessante é o que ele tem de mais humano: sofrendo, se alegrando, vivendo seus altos e baixos, e aprendendo a seguir em frente. Nem nos livros de fantasia os heróis vivem uma vida perfeita.

Mas claro que não falo aqui de fatalidades, pois, nesse caso, entramos num outro prisma, em que é preciso muito mais do que força para vencer esse tipo de dor.

Em Caixa de Desejos, Marília perde a avó com quem tinha uma relação muito forte. Mas com a ajuda de um presente que essa avó lhe deixa, uma caixa para guardar seus sonhos/desejos, e a chegada de uma meia-irmã, a menina encontra um caminho para superar o que há de negativo em sua vida.

P – Conto ou romance? Infanto-juvenil ou adulto?

Ana – Gosto muito de escrever contos, mesmo diante de toda a complexidade que ele encerra. Eu vejo o conto como o caminho que eu tenho para que, rapidamente, eu possa escrever sobre algo que esteja gritando dentro de mim. Já em relação ao romance, cheguei a escrever dois que joguei fora. Atualmente trabalho no que considero o meu primeiro e estou completamente apaixonada. Então, se eu tivesse que ordenar, por preferência, viria o romance primeiro. Já entre o infantojuvenil ou adulto, não tenho como escolher. Há, em mim, duas Ana Cristina Melo. Uma só para o infantojuvenil e outra só para o adulto. Não restrinjo nenhuma delas. Deixo que venha à tona aquela que mais precisa se expressar. E eu amo quando escrevo em qualquer um desses gêneros.

3 comentários em “Da internet para os livros.”

  1. Pingback: André Giusti entrevista Ana Cristina Melo « Caixa de desejos – novela juvenil

  2. André, obrigada pelo carinho, pela divulgação e pela entrevista deliciosa que você me preparou. Ontem, estive off quase todo o dia, pois estava lançando meu livro na Bienal de Minas. Foi um sucesso! Só tive tempo, de manhã, antes do voo, de divulgar a entrevista no Facebook.

    Beijo grande.

  3. Dag Bandeira

    Tenho 63 anos, mais acabei de completar 16 quando terminei de ler Caixa de Desejos e respondi a pergunta que me faço: o que é um bom texto literário? Frases como: “depois desse dia mamãe parecia bem mais jovem. Tão jovem quanto vovó.”, “Já estávamos no pudim de leite condensado, que dividia espaço com a taça de sorvete…”, “Deixei o silêncio avisar que ela me seguisse…….” e outras cositas más, confirmaram a resposta. Pena que o presente do Leo, o primeiro namorado, foi a camisa do Flu. A Vascaína reclama. Parabéns Ana.

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