Etapa queimada

Esse desejo todo de consertar o país e tentar mudá-lo a partir da execração pública dos políticos me faz pensar na cena que vi certo tempo atrás num hipermercado.

Na fila do caixa, o sujeito tomava tranquilamente uma cerveja.

Quando terminou, ainda faltava algum tempo para pagar o que havia comprado. Com a mesma naturalidade que um deputado ou senador pega um avião da FAB para viagens particulares, o homem recolheu a longneck a um canto escondido. Não manteve a pequena garrafa junto ao resto das compras que iria pagar em poucos minutos, portanto, não pagaria pelo que consumiu, daria, como deu, calote. Roubou.

Percebi em seu rosto o sorriso de malícia que um costume brasileiro, histórico e distorcido gosta de caracterizar como sendo de malandragem, mas que não é. É corrupção, que pode não ser igual em valor a que desviou dinheiro da merenda escolar e do remédio do posto de saúde, mas é a mesma no rasteiro valor moral.

Agora, que a mesmice do silêncio do conformismo volta a ocupar as ruas, é de se pensar que a melhor maneira de se mudar o país é fazê-lo em duas etapas.

Mudar a nós mesmos é uma delas.

Talvez, precipitadamente, tenhamos começado pela segunda.

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