O uso escuso de Tiradentes e de todos nós
O diretor Marcelo Gomes explica que para compor o Tiradentes de seu filme Joaquim, utilizou a ficção aliada à pesquisa de registros históricos.
Pois o resultado que conseguiu parece bem próximo ao que realmente deve ter sido o principal nome do mais famoso movimento que tentou separar o Brasil de Portugal.
Joaquim mostra Tiradentes como homem do povo, que em determinado momento dá um basta à usurpação do estado.
Nesse instante, nasce o idealista, que bem intencionado sai pelas Minas Gerais pregando a libertação do país das garras da coroa portuguesa, pensando não apenas em si, mas na melhoria da condição de nossa miséria histórica.
Ficção ou não, o Tiradentes de Marcelo Gomes me pareceu bater com o que historiadores de várias correntes nos apresentam, inclusive quanto às contradições do mártir da independência.
Mas o que me pareceu ainda mais de acordo com a real história do país foi o caráter cínico da Inconfidência Mineira mostrado no filme.
Sem qualquer conexão com o romantismo que os livros de escola impingem à Inconfidência, Marcelo Gomes deixa clara a instrumentalização da ingenuidade de um homem do povo para mobilizar a massa, dobrar o maldito domínio luso e conquistar apenas para uma camada privilegiada seus interesses imediatos e a longo prazo, sem dar a essa massa – não a título de recompensa, mas de justiça – a dignidade com que ela, massa, nunca foi tratada.
Qualquer semelhança com o que aconteceu no Brasil nesses mais de duzentos anos que separam a execução do Alferes dos dias atuais não é mera coincidência.
É só a história do Brasil, crua e real, se repetindo.