O mistério da simplicidade*

É relativamente fácil explicar porque determinados programas de TV estão no ar há tantos anos. Aliados, formato e produção fizeram – e fazem – com que atravessassem décadas no vídeo dos brasileiros, marcando religiosamente a hora do dia, o dia da semana. Mesmo que eu passe longe da TV na hora em que estão sendo exibidos, tenho que admitir que é o caso do Fantástico, do Domingão do Faustão, do Gugu, do Vídeo Show (Meu Deus! Será que não há um exemplo de bom gosto?).

Mas como explicar a permanência – e o sucesso – do Chaves? Se não me engano, ele, Chapolin, Kiko, seu Madruga e os demais já estão arrancando risadas da segunda geração de brasileiros. Agora mesmo, enquanto escrevo, minhas filhas perdem o fôlego de tanto rir na sala. Pela frieza lógica da produção televisiva de hoje, calcada na tecnologia, nos efeitos, no apelo visual, seria inxistente um lugar para Chaves e seu tosco aparato mexicano de cenários, de mixagem e edição de fundo de quintal. Se fosse automobilismo, diria que um Fiat 147 se mantém na pista ao lado de Ferrarris, Masseratis, Porsches.

Precisei lançar meu olhar de pai para entender a durabilidade de Chaves na TV. Ele se porta como criança, foi a conclusão a que cheguei. Faz as mesmas trapalhadas que seus telespectadores fazem ou gostariam de fazer, e da mesma forma inocente, pura, relaciona-se com o Kiko, com a Chiquinha, figuras facilmente identificáveis por nossos pequenos com o amiguinho da escola, a coleguinha do prédio. Daí cheguei à conclusão do óbvio, mas que parece ignorado pela mídia talvez nas duas últimas décadas: a criança, por ela mesma e sem interferência, quer ser tratada como criança, e não como projeção de adulto – mini gente grande  – usando sapatos de salto, maquiagem, roupas que antecipam a sexualidade e vivendo experiências que ela, pela própria característica biológica, não consegue processar.

Provavelmente os produtores de Chaves nunca pensaram em chegar ao sucesso evitando essa “antecipação” de uma maturidade restrita ao invólucro, mas acabaram acertando em cheio.

*Publicado em agosto de 2011

Chaves

1 comentário em “O mistério da simplicidade*”

  1. Sergio Maciel

    Às vezes penso que esse programa foi criado por uma equipe de pedagogos, psicólogos e economistas. “Chaves” deve ser a melhor relação custo/benefício da televisão mundial. Paga, há quase 30 anos, boa parte dos salários do SBT…

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