Trabalho em um dos setores da zona central de Brasília.
Toda 4ª feira, à hora do almoço, há na calçada um culto evangélico, bem junto ao prédio em que estou.
Sendo ou não adepta da crença, a pessoa ouve os cânticos e a pregação.
O culto transcorre em paz, sem que ninguém reclame ou tente impedir que aconteça. Não serei hipócrita: ele me incomoda, mas nada que não seja tolerável, suportável.
Mas gostaria de ver, no mesmo local, em dia alternado da semana, um culto de umbanda ou candomblé, dos quais também não sou adepto.
Será que aconteceriam igualmente em sossego?
É essa dúvida, quanto à tolerância seletiva, que me incomoda.
Pelo que li, a informação ainda está nas mãos de apenas um ou outro colunista, embora já seja desde a semana passada objeto da desconfiança (quase certeza) de muita gente: há sim infiltração no movimento dos caminhoneiros, fazendo com que alguns muitos motoristas não tenham ainda voltado ao trabalho, apesar de a categoria ter conseguido que o governo abaixasse a calça e a cueca.
A procedência da informação são os serviços de inteligência dos órgãos de segurança.
A intenção dessa gente que, infiltrada, impede a normalização do abastecimento vai muito além do preço do diesel. Não é nem um pouco justa como o é a de se reduzir o valor do combustível.
É na verdade uma intenção sórdida, vil, que merece o alerta máximo de quem defende o que ainda resta de legalidade neste país.
A luta agora me parece ser para que o Brasil chegue às eleições de outubro em uma condição, mesmo que mínima, de normalidade institucional e democrática e escolha nas urnas, pela vontade da maioria, quem governará o país nos próximos quatro anos. Que essa chegada seja até mesmo igual a de um corredor que cruza a linha final da maratona engatinhando, completamente sem ar, mas que seja uma chegada e não um rompimento brusco com o destino legal.
O governo Temer é desastroso, nunca foi outra coisa.
Mas, nos mantenhamos atentos e vigilantes porque (acreditem!) pode haver coisa ainda pior do que ele.
Me dê o o direito de achar que o governo de Dilma Rousseff foi realmemte ruim, especialmente no segundo mandato.
Mas me dê também o mesmo direito de achar que ainda assim era bem melhor do que o golpe que você apoiou e que foi urdido pelo candidato corrupto no qual você votou (ao menos no segundo turno) e que está levando esse país à beira do abismo.
Leio nas agências de notícias que só há gasolina em mais oito postos do Distrito Federal.
Ontem, perto de 11 da noite, havia quilométricas filas para abastecer em Brasília.
Tudo bem, há gente que realmente precisa do tanque cheio, e que por isso precisou perder duas ou três horas de sua existência terrena para encher o tanque.
Mas aposto que boa parte poderia sobreviver com apenas o meio tanque que restava, até mesmo um quarto, e que encontraria alternativa se o carro não pudesse sair da garagem.
Não encarei a confusão. Quando a gasolina acabar – e vai acabar amanhã ou depois – vejo o que dá para fazer. E o que não der para ser feito, não será.
Há (ainda) ônibus, uber, táxi, bicicleta, carona solidária, trabalhar de casa.
Vários modos de, em meio à tensão e à ameaça de caos, não alimentar essa histeria coletiva que só torna ainda mais instável o ambiente político desse país à deriva.