O que mais dói nem é a imagem do corpo do pai assassinado em um assalto na porta do colégio dos filhos, enquanto esperava para pegá-los na cidade do Guará, a uns 20 minutos de Brasília (sim, pra espanto da TV Globo, há coisas que não acontecem apenas no Rio de Janeiro).
Pelo que os jornais deram, o homem havia pego o carro novo na concessionária pela manhã, e depois foi buscar os filhos, uma menina do ensino fundamental e um rapaz do ensino médio.
Com essa informação, não é difícil imaginar o pai anunciando aos filhos, no café da manhã: “Vou pegar vocês de carro novo!”, e a ansiedade feliz dos dois, principalmente do rapaz, que está em uma idade em que automóvel representa muita coisa, inclusive masculinidade. É claro, no dolorido flash que nos passa pela cabeça, a mãe também sorri, satisfeita com sua família em paz.
A dor maior deixa de ser a imagem em si, fruto da estupidez, o corpo estendido sob o lençol branco. O que machuca muito – principalmente quem é pai, e se põe no lugar de modo automático – é justamente a quebra dessa ansiedade feliz e sua troca abrupta pelo choque da notícia da tragédia e seu imediato sucessor, o desespero.
O que dói mais é saber o quão foi tortuoso para esse menino e essa menina, em segundos, precisarem entender que não iriam mais voltar para a casa no carro novo do pai. Que não irão mais a lugar algum com o pai, nem no carro novo, nem de avião, trem, foguete, espaçonave, tapete mágico. Apenas, certamente, em pensamento e nos sonhos mais sentidos.
Como sempre, uma imagem possui muito mais significados além daquele que uma fotografia se limita a mostrar.