Sobre inveja e distância

Amigo meu envia pelo zap foto de sua mudança.
Ele e a mulher estão deixando Brasília após décadas, vão se encravar no meio das montanhas.
Por mais que seja bom para ele e ele esteja feliz com a mudança, eu não costumo dar festa quando um amigo vai embora para longe, ainda que se possa visitá-lo quando for possível.
É que amigo não é vela de filtro, que a gente troca em trinta segundos e a água volta a jorrar limpinha.
Esse meu amigo é um dos melhores poetas contemporâneos, de acordo não apenas com o humilde crivo do poeta que também sou, mas também do leitor diário de poesia.
Nos conhecemos vinte anos atrás, justamente por causa de um livro de poesia que ele, à época, estava lançando.
Passamos tempos distantes, até que nos últimos anos nos aproximamos, e acho que nem foi apenas por causa da poesia e da literatura em geral, mas muito devido a um senso comum de humanismo, valor caro nesse primeiro quarto de século.
Não o invejo pelos milhares de livros que ele encaixota na mudança e que aparecem na fotografia enviada.
Invejo (com a inveja boa) o destino que tomarão tudo isso e mais ele e a esposa, uma pessoa que torna ainda mais bacana ser amigo do meu amigo.
Invejo pela beleza do lugar que eles nos mostram igualmente em fotos, uma cidade que, de acordo com os dois, tem vida noturna e agitação cultural, o que não é comum em lugares assim.

Mas essa crônica não é sobre inveja.
É sobre distâncias.
Distâncias com os quais aprendi a conviver desde quando pisei em Brasília pela primeira vez, mais de vinte e sete anos atrás.
Distância dos pais, dos irmãos, dos amigos semeados na adolescência e que floriram, felizmente, na fase adulta; distância de um grande amor, distância do mar e da serra.
Aprender a conviver não significa que você deixou de sentir. E de ressentir.
Reconheço que a vida em Brasília trouxe para perto de mim várias pessoas que fizeram casa em meu coração, e esse meu amigo poeta é um deles.
Só que é o mesmo amigo poeta que se vai, para viver nos braços da distância que eu tanto conheço, que eu tanto já vi, que eu tanto vivo.
Um dia chegará a inexorável distância final, a mais longínqua de todas, e restará, juntamente com a saudade, uma esperança de sujeito teimoso, acreditando que vai encontrar todos (os longes e os pertos também) em alguma estação quando desembarcar do trem azul, com o sol na cabeça.













O papo envereda pelo Spotify em si, sobre como o aplicativo (com mais prós do que contras, a meu ver) revolucionou nosso modo de escutar música e que, para quem estiver de coração e ouvidos abertos, pode mostrar quanta coisa boa se faz no Rock nesse século 21, contrariando a má vontade dos dinossauros e aquele discurso sonolento de que “Rock bom é só até o anos 80”.