O Patriota

Quando a filha fez três anos, matriculou-a logo no curso de inglês. Uma vez um consultor de RH disse na rádio de notícias que, hoje em dia, quanto mais cedo o ser humano se preparar para o mercado, melhor. E o inglês é a chave-mestra desse proceso. Aliás, por ele, a filha teria sido alfabetizada em inglês.

Tem uma pequena empresa de informática, a Star Ship, e o nome reluz em letras vermelhas e azuis com o fundo branco do letreiro. Ele sempre starta e stopa os processos, não deixa o cliente sem feed-back.

Adora essa época de festas juninas, todo mundo vestido de cowboy, as mulheres com longas botas de camurça e saias compridas, lá nas canelas, que elas giram ao som do country. Todos os anos, na festa junina da escola da filha, ele é o xerife, já virou tradição. Melhor mesmo só o halloween, ele, a mulher e a filha se vestem de vampiro e de bruxas. Os vizinhos também, e todos saem pelo Beverly, o condomínio em que moram. O que querem mesmo é passar o halloween em Nova York. Já foram duas vezes a Miami, fizeram ótimas compras, agora querem variar. Europa? Não, aqueles museus, muita estátua, tudo muito antigo, eles não têm vontade. Amazônia , nordeste? Talvez um dia, não sabem. Ele não gosta de índio; ela, de miséria.

Patriota? Sim, ele diz que é. Não vê agora mesmo com a Copa? Comprou a camisa oficial da seleção e amarrou a bandeira no capô do carro. Faz questão de passar assim quando o vizinho argentino está no jardim, tudo para mostrar que o Brasil é um país bem melhor que o dele, que só ganhou duas vezes.

2 comentários em “O Patriota”

  1. Muito bom o texto. Sintético e mordaz. Vai bem na ferida e mostra que o mundo é cada vez menor para quem pensa pequeno, pensando que está pensando grande. O olhar social de suas narrativas está cada vez mais agudo!

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