Torcedor, esse pobre de espírito atrasado emocionalmente

Torcedor

Não enxergo despautério maior do que sofrer por causa de um time de futebol.

Quanta energia desprende o ser humano, em sua existência de finitude inexorável, em se abalar por causa de 22 sujeitos tentando domar os caprichos de uma bola. Quanto dessa energia poderia ser empregado por ele em algo que o melhorasse como pessoa e, por conseguinte, melhorasse também a vida ao redor de si.

Qual propósito em atravessar os dias que antecedem uma final de campeonato em estado de angústia permanente? Enquanto mastiga dentro do peito esse sentimento opressivo, o homem não percebe as dádivas que a natureza o oferece desde os primeiros minutos da aurora às estrelas distantes da noite.

Tudo por causa do futebol.

Que pobreza espiritual enxergar em detalhes bestas sinais de que há conspiração favorável ou contrária a seu time no dia da peleja decisiva. Que influência terá no resultado mudar o local de assistir ao jogo ou vestir uma roupa diferente daquela que se trajou na última vitória?

Quanto atraso emocional no grito enlouquecido na janela, acordando a vizinhança no início da madrugada, na hora que o juiz apitou o fim do embate por um troféu que ele, torcedor, nem sequer verá de perto. Nenhuma diferença fará em sua vida o time A, B ou C levantar a taça.



(Meu Deus! Como sou pobre de espírito e atrasado emocionalmente!)

Crack, rebite e corrupção

Rogeriano Cardoso/ Estado de Minas
Desastre

Ótima reportagem exibida hoje nos telejornais da TV Globo mostra que os motoristas de caminhão estão pegando as estradas sob o efeito de álcool e drogas.

Nada que ninguém saiba.

A novidade me parece ser a variedade de substâncias, que aumentou, bem como a quantidade.

O crack que a cada dia aumenta as legiões mortos vivos nas ruas das grandes cidades, é o mesmo que está sendo consumido por homens que dirigem veículos que pesam 13, 15 toneladas.

Ao repórter, um caminhoneiro conta que já ficou cinco dias sem dormir, a base de rebite, para cumprir o prazo estipulado pela transportadora.

Com tanta pedra, pó, fumo, comprimido e birita na cabine, passar por uma carreta numa rodovia brasileira é como brincar de roleta russa.

Resolução do Conselho Nacional de Trânsito, Contran, tenta conter a água que jorra dessa fonte de tragédias nas estradas brasileiras. Se o caminhoneiro que for renovar ou tirar a carteira for pego numa espécie de exame antidoping, não conseguirá o documento. A intenção é boa e a providência é urgente.

Mas aí a gente lembra que alguém no laboratório pode ser subornado para alterar o laudo do exame. Lembra que poderá haver também o guarda rodoviário aceitando dinheiro para deixar seguir viagem o motorista que não renovou a carteira.

Pior que a combinação explosiva que mantém rodando as carretas pelas rodovias será sempre a corrupção, nesse caso específico se sobrepondo à lei para ceifar vidas no asfalto.

O silêncio dos que não têm o que dizer

Onde estarão, agora, os integrantes do movimento Procure Saber? Provavelmente junto aos que criticavam o Programa Mais Médicos, fazendo o “silêncio dos que não têm mais o que dizer”.

A reportagem é simplesmente da TV Globo.

So lonely

1. O silêncio da casa, enfim, arranjou uma companhia: a tua ausência.

sozinho em casa

2. O meu lado da cama é o do meio

cama vazia[67]

Resenha – Histórias de Pai , Memórias de Filho*

Por Fernando Ramos

Confesso que quando adquiri Historias de pai, memórias de filho, livro recente do André Giusti, foi mais por admirar sua escrita do que pelo tema. Apesar de ser pai de um moleque lindo de oito anos, não era o tipo de leitura que me procurava atualmente. Ando mais afeito às histórias sanguinolentas e viscerais, como as fonsequeanas do que qualquer outro gênero. Entretanto, fui movido e instigado pela resenha de uma amiga grávida de seu segundo filho – talvez vivendo seu ápice de sensibilidade sentimental.

Tive duas perspectivas com Histórias de pai, memórias de filho. A primeira foi da leitura como um todo. Achava, presunçosamente, que não ficaria tocado, até me perceber em lágrimas contidas com histórias singelas, como em Janelinha. Ou de doce cumplicidade e bom humor ilustrado em Toca Raul. André contou essas e outras como se o ouvíssemos em um bate-papo intimista: por vezes se emocionando; em outras esperando o que virá; ou apenas rindo com o humor fino de seus contos. Foi inevitável lembrar de vários momentos de beleza e simplicidade com meu filhote, com meus pais.

A segunda perspectiva foi mais técnica, ligado às nuances do texto. Intrigou-me saber como seria a narrativa de André neste livro, pois pelo título, me parecia algo contido, autobiográfico. Mas estava tudo ali, como a destreza para cortar o desnecessário das histórias, retratado em O mais novo grande senhor do tempo. André, em uma linha, explica os motivos do personagem não usar relógio. Muitos teriam um trabalho hercúleo e desnecessário para contextualizar isso. Talvez usassem um, dois parágrafos, desvirtuando o enredo, perdendo o leitor de vista. Outro aspecto sempre marcantes nas construções frasais do André são as metáforas. Os paralelos traçados por ele são imaginativos. Leitores mais atentos verão a formosura dos detalhes e também entenderão como o autor transformou uma sensação intangível em algo palpável, que se ergue em nossa frente e evita o passar de olhos correndo pelas linhas do texto. Um exemplo é um trecho do primeiro conto do livro A primeira noite de um homem: “Para ver pela primeira vez o rosto mais amado de sua vida, sem jeito ele teve que desfazer um tanto aquele embrulho. Assemelhava-se ao faminto que precisa vencer a casca grossa da fruta até chegar à polpa.” Quem é pai logo se lembra perfeitamente do pequeno desespero, a ansiedade de querer ver logo o rosto de seu filho em um embrulho com mais pano do que gente.

Mas foi no conto A vida é linda, Carlos Alberto! que li, reli e grifei o mesmo trecho várias vezes. Nele, somos capazes de sentir a alegria em alvoroço do personagem em sua primeira viagem na adolescência, graças à conotação delicada: “Acima do tumulto, pairava a ânsia pela farra, e amarrada a ela, feito rabiola de pipa, uma sensação de que haveria sempre uma música no ar…”

É exatamente a sensação dessa analogia que fica da leitura: de dança delicada, suave flutuar, leveza fraterna dos momentos inocentes em família. Momentos que fazem de nós o que somos.

Ao terminar o livro, peguei o telefone e liguei para mainha, painho e depois para o meu filho. Disse que tinha um livro que eles precisavam ler um dia.

http://autorfernandoramos.com.br/ — com André Giusti.

*Conheça Histórias de Pai, Memórias de Filho na seção Livros do meu site

Exemplo

Chega a ser emocionante ver uma escola pública bem cuidada.

escola

O exemplo da foto é o Centro de Ensino Fundamental 01, da Cidade Estrutural, no DF, uma das áreas mais carentes junto à capital do país.

No último sábado – dia de descanso -, passei por lá, ao acaso, e, além dos funcionários, encontrei uma senhora que me pareceu ser da diretoria.

Será que isso tem a ver?

Pra encerrar, uma pergunta de retórica: será que não pode ser assim sempre, em todo o DF, em todo o Brasil?

Claro que pode. É só querer, porque o Estado pode, e pode muito dar educação de qualidade.

Estado sovina. Ou perdulário.

Tony Winston/GDF
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A Camerata José Maurício é uma orquestra formada por jovens e adolescentes que moram em São Sebastião, cidade do Distrito Federal, há cerca de 20 Km de Brasília. Não chega a ser das cidades mais pobres que rodeiam a capital federal, mas tem carências de infraestrutura, de escola, de saúde. Quando o assunto é arte e cultura, então, o vácuo aumenta. Se o público for os jovens, o que se oferece é o mais do mesmo que se encontra nas periferias brasileiras: ou nada ou bailes embalados pelo pastiche da indústria cultural.

Os integrantes da orquestra são jovens considerados pelas autoridades como aqueles de risco social. Porque, na ótica oficial, são pobres, sujeitos às tentações que a criminalidade pode oferecer. Portanto, a camerata é a chance de não virarem estatística (e é ainda um bem a nossos ouvidos, porque possuem qualidade musical).

Por trás da orquestra, há uma escola que ensina música clássica a cerca de 100 meninos e meninas, a partir dos nove anos. O maestro Kassai conta que uma das batalhas no momento é conseguir uma sede própria nesse Distrito Federal de tanta terra pública vazia e sujeita à especulação e à grilagem.

Mas a maior briga, segundo o maestro, é conseguir R$ 100 mil de uma emenda parlamentar na Câmara Legislativa para que no ano que vem a escola possa pagar professores e comprar instrumentos. É dinheiro que significa a sobrevivência da escola no ano que vem, ano da Copa, que já sugou mares de dinheiro público em estádios de custo benefício social discutível. É dinheiro que significa manter aberta uma chance na vida para centenas de jovens que, normalmente, desconhecem justamente essa expressão: chance na vida.

No mesmo DF, administradores públicos foram afastados por gastarem, numa única noite, R$ 600 mil com cachês em shows gratuitos que certamente nada acrescentaram culturalmente à população, mas apenas a pretensões eleitorais deles próprios.

Se o Estado fosse uma pessoa física, R$ 100 mil para ele seriam como R$ 10 na carteira, esmola para o almoço de um faminto ou a passagem de ônibus de quem não tem como voltar pra casa. Mas o Estado é um sujeito que prefere gastar R$ 500 num jantar para amigos.

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