Estrela da hora do rush

Os sinais de trânsito mudavam de quando em quando, iguais às suas certezas, que ao longo do dia faziam e se desfaziam em dúvidas, e voltavam tantas outras vezes a serem certezas. Lembravam roupas de boneca, que além do lado certo, também podem ser vestidas pelo avesso para incrementar a brincadeira.

Pela manhã, era convicto de tudo, seguramente certo do que faria. Na hora do almoço já admitia outras possibilidades, e quando a noite chegava para dar seu expediente de medos e mistérios, ele não garantia nada que houvesse resolvido quando saíra de casa pleno de esperança em soluções e jeitos arranjados.  

(Havia sido tão mais cômodo nas outras vezes em que a vida se antecipou a ele e mudou os móveis de lugar, ou mesmo trocou a mobília inteira ou parte dela).

Anos luz acima dos nervos inflamados da estação rodoviária, vênus brilhava complacente com os homens apressados que nela jamais reparavam. E enquanto aguardava que abrisse o sinal da ocasião, olhava a estrela pedindo que alguém, ou até mesmo ela, decidisse por ele o que dele escapava da coragem.

Enfim, adeus JB.

Sou provavelmente da última geração de jornalistas que sonhou  trabalhar no Jornal do Brasil. Quando nos formamos, na virada dos 80 para os 90, foi comunicado que o jornal sofria de um câncer irreversível – o da má administração -, cujos sintomas vinham aparecendo nos últimos anos, embora tratados somente com aspirina.

O que nos encantava ainda no JB naqueles idos de 85, 86 era a postura do jornal em relação à ditadura militar. Mesmo que não tenha sido sempre um órgão extremado no combate ao regime de exceção, me pareceu sempre ter deixado claro que não era simpático aos generais, muito ao contrário do que fez seu concorrente direto no Rio de Janeiro. É bom lembrar que na relação da grande imprensa com a ditadura, não adular as fardas já era algo louvável, e isso cativava aqueles embriões de focas que escolheram a profissão bem nos anos de abertura política, quando o país estava, ele próprio, começando a se passar a limpo.

Outro vértice do nosso encantamento eram o status de se trabalhar no JB e a oportunidade de cursar, na prática, uma verdadeira escola profissional, tão diversa do (até hoje) alienado currículo das faculdades de comunicação. Nos víamos naquelas grandes salas do prédio da Avenida Brasil, 500 (nossa geração não pegou o lendário prédio da Avenida Rio Branco), sentados ao lado, quem sabe, de João Saldanha, Oldemário Touguinhó, Carlos Castelo Branco, Villas-Boas Corrêa, atendendo talvez um telefonema do Afonso Romano de Sant’anna, lendo no original, antes que fossem para a oficina, a coluna do Drummond, uma charge do Ique.

O Jornal do Brasil trazia o nome do país, mas era verdadeiramente a cara do Rio de Janeiro. É certo que sua preocupação maior era traduzir a vida de Ipanema e Leblon, mas eu que sou do subúrbio posso atestar a forma lírica com que o jornal olhava para os bairros da linha do trem, ao contrário dos concorrentes, preocupados com o outro lado do Túnel Rebouças apenas quando havia tiroteio ou era carnaval.

O JB que agora encerra as atividades era como uma pessoa que tomou para si a identidade de um defunto famoso em vida, como se dissesse – e tentasse fazer o mundo acreditar – que o outro não bateu a cassuleta. Embora até conservasse uma certa dignidade – foi o JB que primeiro falou em mensalão, uns seis meses antes do escândalo estourar – , só era possível ler o JB se sobrasse tempo, porque o resto das horas dedicadas à leitura dos jornais se consumia com O Globo, Estadão, Folha e, no meu caso aqui em Brasília, o Correio Braziliense.

O JB acaba numa época em que os repórteres voltam das reportagens sem, muitas vezes, perguntarem o óbvio aos entrevistados. Num tempo em que a pobreza vocabular devasta o texto jornalístico tanto nos veículos impressos quanto eletrônicos, e que ser espirituoso, divertido nas reportagens, vale mais do que informar. O jornal que primava pelo bom gosto, morre justamente quando, em nome da audiência, mas com o discurso cínico de que a intenção é informar a sociedade, as grandes redes devem estar disputando os pedaços do corpo da ex-amante do goleiro para mostrarem no horário nobre.

Minha maior tristeza com o fim do JB, é sentir que ele se vai justamente quando a imprensa precisava que ele se reiventasse, mas com o espírito que o fez, certamete, o jornal mais importante do país no século 20, e ajudar essa mesma imprensa a encontrar outra vez o seu sentido de existir na sociedade brasileira.

Pelo fim do impedimento

A grande discussão da Copa do Mundo vencida pela Espanha certamente foi o uso da tecnologia para auxiliar a arbitragem. Outra, no entanto, talvez seja tão necessária quanto, e é ainda mais antiga.

Alguém consegue explicar – ou antes entender – qual a finalidade do impedimento? A mim não parece outra senão a de impedir a principal razão de um jogo de futebol, o gol. Talvez até por isso mesmo a regra tenha esse nome.

Aliado das retrancas por natureza de sua criação, o impedimento é como um tribunal inquisitor que manda para a fogueira o passe preciso e a vivacidade do atacante que se antecipa ao zagueiro tosco, pesado e de vocação para botinadas.

Quantos lindos gols ao longo da história não morreram no parto por causa do veneno abortivo do impedimento! E tudo porque o ataque fez seu papel em prol da alegria do jogo: ser mais rápido que a defesa, que acaba sendo premiada em seu erro. Se o defensor não viu que o adversário estava sozinho na área, problema é dele, do zagueiro. Mas não, no entender do tribunal carola puna-se a esperteza, o talento de se desmarcar para buscar a felicidade do torcedor.

Mas se fosse assim, os atacantes viveriam na “banheira”, ou seja, sempre adiantados em relação aos zagueiros, é a alegação dos que defendem a regra que privilegia a defesa. E qual zaga seria louca de deixar livre na cara do gol, por exemplo, o Romário campeão de 1994? Se deixar, melhor para o espetáculo.

Bilhete sobre a Copa.

Henrique Miranda é professor de história e poeta. Não sei se anda fazendo versos de forma sistemática, mas de quando em vez me manda bilhetes que são ótima prosa poética, como este abaixo que reproduzo aqui sobre a final de ontem, texto que, aliás, veio bem a calhar diante da minha preguiça de ontem em escrever para atualizar meu blog.

Há pouco tempo relia uma crônica do Paulo Mendes Campos e esbarrei com uma que falava de futebol. Escrevia da monotonia do futebol como burocracia orquestrada pelos temerosos técnicos tecnocratas.

Assisti à uma decisão de Copa do Mundo sem medo de taquicardia. Salvo arrancadas de Robeen, milagres de Casillas e o toque envolvente do ataque espanhol, houve um futebol de repartição pública de segunda-feira.

Depois de um almoço de domingo, e  deitado no sofá da sala, ressonei parte do primeiro tempo, acordando com bolas chutadas por João Paulo, de três dedos, que jabulavam pelo corredor e estouravam na parede da sala.

Confesso que torcia por chutes dos holandeses na esperança de ver a namorada do Casillas. De qualquer forma, no final, fomos recompensados.

Nem no segundo tempo, quando não há mais o que fazer a não ser atacar os times,  não se desprenderam de um funcional meio-campo.

Como a vida não tolera omissões, foram para a prorrogação, terra onde as pernas faltam, o ar é rarefeito e a técnica ganha o nome de raça. E esta era a pátria espanhola, onde o touro sangra, mas fica em pé até morrer.

Enquanto a Holanda insistia em contra-ataques ( o que era estranho, pois os dois times haviam avançado o meio-campo) a Espanha jogou com seu toque de bola e algum talento, mas nos estertores da agonia. 

O choro de Casillas emblemou tudo. A taça foi para mãos nunca dantes campeãs. Ah! E ganhei o bolão lá de casa: Forlan o melhor

A trajetória experimentalista de Wilson Bueno

Por Alexandre Pilati*

A morte trágica do escritor Wilson Bueno, assassinado há pouco mais de um mês, deixou a literatura brasileira contemporânea sem uma de suas mais originais vozes. Wilson Bueno era um autor reconhecido pela crítica e que começava a alcançar um público mais significativo a partir de publicações recentes pela Editora Planeta, de maior expressividade editorial. Se podemos falar de uma característica marcante de Bueno, esta é a sua competência para experimentar linguagens. Isso o integrar um seleto grupo de autores curitibanos, entre os quais podemos citar Paulo Leminski, Jamil Snege, Valêncio Xavier. É marcante, na obra desses autores, que certamente inspiraram muito Wilson Bueno, a inquietação diante dos limites da palavra literária, o que os leva a testar novos horizontes a cada novo texto. Esse era exatamente o caso de Bueno, um autor inovador e inquieto, que levava o trabalho com a palavra ao limite da exaustão. Seus livros não ficarão conhecidos pelos enredos mirabolantes, mas sim pela experiência com a linguagem que propõem. Cumpre lembrar ainda que, ativista cultural, Bueno foi o editor do premiado jornal de cultura Nicolau, que fez muito sucesso nos anos 90 em Curitiba e em outras partes do país.

A estreia de Bueno como grande narrador

Bueno começou a ficar conhecido pela publicação, em 1992, de uma narrativa experimental chamada Mar paraguayo. O texto tem enredo simples: trata-se apenas de uma história que relata a vida sofrida de uma mulher e do personagem que é conhecido como “El viejo”. Entretanto, o livro que, que saiu pela editora Iluminuras e está esgotado, configura-se como uma experiência de linguagem que junta português e espanhol e os soma ainda ao idioma guarani, criando uma espécie de língua literária da fronteira do Brasil com o Paraguai. Mar paraguayo apresentou a verve experimentalista de Bueno ao Brasil e ao mundo, abrindo portas nos meios acadêmicos e editoriais para o autor.

Depois de produzir até mesmo livros infantis, Wilson Bueno conseguiu um bom contrato com a editora Planeta, que fez com que seu nome se tornasse cada vez mais familiar aos leitores que acompanham literatura contemporânea no Brasil e em outros países, tais como o Chile, o México e a Argentina, nações onde seus textos chegaram depois de traduzidos.

O amadurecimento literário

Nessa leva da Planeta, podemos verificar que Bueno amadurece o método de absorver um estilo literário alheio para depois tentar recriá-lo em novas histórias. Foi assim com o seu livro de estréia na editora, de 2004, intitulado Amar-te a ti, nem sei se com carícias. Nessa narrativa, Bueno absorve o estilo de nossos escritores do século XIX, especialmente Machado de Assis, para contar uma história ambientada no Rio de Janeiro daquele século. O enredo, também retoma as clássicas histórias do romance brasileiro novecentista. Trata-se de uma intriga narrada em um manuscrito encontrado num palacete prestes a ser demolido, no bairro de Botafogo, de autoria de um certo Leocádio Prata. Como não poderia deixar de ser, apresenta-se no romance um verdadeiro triângulo amoroso à Machado de Assis. Mas o destaque mesmo é para a linguagem literária do passado que é magistralmente recriada por Bueno.

Outro livro de Bueno que teve uma grande repercussão, também editado pela Planeta, é A copista de Kafka. A obra é composta por 27 contos que imitam o estilo kafkiano e que vão se alternando à apresentação de trechos do diário fictício de Felice Bauer, que trabalhava como copista para Franz Kafka. Mesmo contendo bons momentos, de grande criatividade, este livro parece mostrar um autor mais saturado desse mecanismo de experimentação que visa aprofundar-se em influências alheias.

Uma literatura sempre precisa de autores que puxem o carro da vanguarda, da inovação e da pesquisa linguística. Essa é um dos vetores a partir dos quais ela evolui. Wilson Bueno era um desses grandes experimentalistas, cuja imagem, certamente, nunca combinava com o conformismo que é marca do nosso mercado editorial. Segundo informações que circularam na imprensa na última semana, Bueno deixou pronto um livro, intitulado Mano, a noite está velha, que ainda não tem data prevista para publicação. Esperemos que ele saia em breve para coroar o projeto de experimentação do autor e também que o seu Mar paraguayo possa ganhar nova edição, para conhecimento dos jovens que, agora, infelizmente, assistiram ao seu cruel assassinato.

*Alexandre Pilati participa comigo do bate-papo literário na BandNews FM – 90,5 – Brasília  às 2ªs feiras às 16h51, com reprise às 11h31.

Para quem torcer?

Há dois dias tento responder a mim mesmo para quem torcerei na final de domingo. Não consigo e acabo confessando minha dificuldade em dissociar alguns fatos históricos e recentes das seleções de Holanda e Espanha.

Acho irônico, debochado até, que a Holanda seja campeã justamente no país onde ela disseminou o ódio racial e a estupidez segregacionista. É só futebol, mas não acho que mereça, não na África do Sul. Num mundo imaginário, chego a sorrir pensando numa final entre holandeses e os donos da casa e o placar final de 4X0 para a África do Sul. Seria a vingança gloriosa de um povo contra a barbárie. É só delírio, certamente. Lindo delírio cinematográfico.

Quanto a Espanha, a dificuldade em torcer passa por uma questão que envolve nós, brasileiros. Mesmo que não nos importemos – pois o que nos ofende é apenas a Argentina – diversos brasileiros são barrados no aeroporto de Madri. Impedidos de entrar, são maltratados e mandados de volta, humilhados, perdendo a viagem de férias e até mesmo a visita ao parente. Portanto, não me sinto nem um pouco à vontade, muito menos motivado, a torcer pela Espanha.

Digamos que andando pela rua, uma hora antes do jogo, eu topasse com uma lâmpada mágica, a esfregasse e dela saísse o Joseph Blatter vestido de gênio mandando que eu fizesse um pedido em relação à partida. Eu pediria, então, que os dois perdessem e que o Uruguai, sendo terceiro colocado, fosse declarado campeão. Mas antes disso, é claro, o Uruguai precisa colaborar com o meu pedido absurdo e vencer a Alemanha.

Sem poesia, por favor

Deixo a TV ligada na cozinha e fico do quarto, no computador, ouvindo o Jornal Nacional e esperando a cobertura de Holanda e Uruguai. Acompanhei o jogo até os 30 minutos. Portanto, perdi o segundo gol Uruguaio, quando a Celeste ameaçou um milagre.

Ouço a chamada da reportagem, calço os chinelos rapidamente e corro até a cozinha. Paro em frente ao televisor, quero conferir o que perdi. Mas o que vejo é uma espécie de “crônica bonitinha” sobre a partida, aquele jogo meloso de palavras que tem a obrigação de casar com as imagens captadas pelas câmeras colocadas até nas privadas do estádio se duvidarmos.

Permaneço em frente à TV na teimosa esperança de que a reportagem cumprirá seu papel clássico e fundamental, que é o de informar. Quero ver de novo o golaço da Holanda que abriu o placar, o empate do Uruguai e, como já disse, o restante que um compromisso no final da partida me fez perder.

Mas toma-lhe de literatice, de texto piegas com locução pretensamente emocionada nos ouvidos do telespectador. O texto faz mais curvas que a Jabulani, sendo que esta, ao menos, de vez em quando chega ao seu objetivo, que é a rede. E a seu modo as imagens acompanham a pieguice, exibidas em uma velocidade na qual mais parece que o jogo foi disputado em solo lunar, na ausência da gravidade.

Mas e o gol que eu perdi? Os outros que quero rever? Pergunto sabendo que o tempo da reportagem já está se esgotando. Não adianta, o repórter insiste em poesia de banco de escola em vez de informação, e no lugar dos lances inteiros dos gols, as imagens se sucedem mostrando apenas a bola já beijando no barbante, tudo naquele ritmo de pluma caindo do alto de um prédio numa tarde sem vento.

Volto ao quarto pensando que jornalismo é esse, pretensioso na sua ambição de informar levando ao público um espetáculo emocionado em cada reportagem, angariando fãs entre os iludidos estudantes de comunicação e alguns jornalistas ainda deslumbrados, que se esmeram em copiar esse modelo todos os dias. Provavelmente o errado sou eu, rabugento com mais de 20 anos de imprensa, procurando na internet um link em que eu possa encontrar a informação que o telejornal não me deu.

De volta à Copa do Mundo

Do que se chegou a imaginar como Copa América em plena África do Sul, sobrou apenas o Uruguai, e mesmo assim para disputar o tanto faz tanto fez do terceiro lugar, uma briga mais sem graça que dançar com irmã. Dos cinco sul-americanos, três caíram diante de adversários visivelmente mais fortes, o Chile contra nós – jogo que iludiu os que se enganam pela cegueira do ufanismo -, a Argentina e o próprio Uruguai. O Paraguai  deixou a Copa talvez pela falta de sorte, o que nem sempre significa exatamente azar. O Brasil rodou por uma série de fatores, entre os quais a falta de time.

A possibilidade da Holanda ser, enfim, campeã do mundo chega a ser um deboche social-histórico. Com tanta copa para vencer, é irônico que o país encontre a glória exatamente onde ajudou a implementar um regime odioso de segregação racial.

Mas a presença da seleção laranja na final reserva duas possibilidades interessantes. A primeira é o duelo entre dois países que jamais foram campeões do mundo, caso a Espanha se classifique. A última vez que dois sem título disputaram uma final foi em 78, a copa do Peru comprado. A Argentina levou a melhor sobre a própria Holanda, que 32 anos depois permanece sem o caneco.

A segunda possibilidade é a reedição da final de 74, e aí faço um lembrete aos alemães, sensação da Copa das vuvuzelas. Não foram raras as vezes em que o melhor time ficou chupando dedo. A Hungria em 54, a mesma Holanda 20 anos depois e o Brasil de 82 deram show, mas saíram do picadeiro com as luzes apagadas.

Portanto, Alemanha, cuidado! Pois assim como o apartheid, o futebol também sabe ser injusto e cruel.

A ilusão do brahmeiro

Cerca de dois anos atrás eu estava no caixa de um supermercado no Lago Sul, bairro chique de Brasília, e a minha frente três moças de no máximo 20 anos. Cada uma levava duas pequenas garrafas de vodka mais quatro latinhas de cerveja. Outros 20 anos separavam aquela cena dos meus tempos de ir ao supermercado comprar uma garrafa de run para misturar com coca-cola em alguma festa. Mas a diferença não era somente de época. Até passar no caixa, eu procurava esconder a bebida e depois ia embora, tudo para não topar com algum vizinho ou conhecido. Naquelas três não havia qualquer pudor em ao menos disfarçar as garrafas e as latas, mas ao contrário, empenho em agir com naturalidade, como se a intenção fosse demonstrar que eram vivas e alegres porque bebiam ou vice-versa.

Lembro desta cena porque saiu nos jornais pesquisa do Ministério da Saúde mostrando os números do consumo de bebida no país. No Distrito Federal, entre as mulheres, o número mais do que dobou em relação à última pesquisa, em 2008. Fora as baianas, aqui estão as mulheres que mais entornam no Brasil.

O exemplo das mulheres do DF talvez sirva para refletir se não há atualmente em torno da bebida alguma coisa que possui tanto apelo quanto o glamour que acompanhava o cigarro nas propagandas até os anos 80.  Diferentemente do que fazia com o fumo, a propaganda não diz que seremos belos e bem sucedidos se bebermos, mas dá a entender que seremos mais felizes socialmente e arrumaremos mais amigos. Existe até mesmo algo que disfarça uma tentativa de associar o hábito a uma qualidade de caráter, a uma forma elogiável de conduta. Se prestarmos atenção no texto e na forma como ele é lido no comercial da Brahma, por exemplo, é de se supor que ser brahmeiro é o mesmo que enfrentar com coragem os percalços da vida, ser persistente, não se abater com as derrotas. Substituíram a exploração erótica da imagem das louras por uma imagem forjada de pessoas conscientes da vida. 

Terreno fértil para o plantio da propaganda, o jovem vai bebendo mais e mais a cada ano, e não apenas para descontrair – o que é normal e saudável – mas para cair, passar mal, não lembrar de nada no dia seguinte e ainda pôr, em muitos casos, em risco a vida dos outros.

Se hoje em dia fumar é brega, de quanto tempo precisaremos para descobrir que ficar bêbado não faz de ninguém belo, charmoso e muito menos capaz de fazer bons amigos ou resolver seus problemas?

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